Modelo EMBARGOS SBDI-1 do TST
- Wendell Rodrigues
- 19 de out.
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DOENÇA PSIQUIÁTRICA. SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR. TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. AUSÊNCIA DE PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO. EMPREGADO CONTRATADO MEDIANTE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. DISPENSA. CONTRARIEDADE À SÚMULAS 126 E 443 DO TST
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peça licença ao autor.

EXCELENTÍSSIMO MINISTRO PRESIDENTE DA Xª TURMA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
Autos do processo 000000
XXXXX XXXXX XXXXXX, já qualificado, vem à presença de Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado infra-assinado, interpor
RECURSO DE EMBARGOS
com fulcro no artigo 894 da CLT, requerendo seu regular processamento e distribuição a um dos Ministros (as) integrantes da SBDI-1 desse TST.
Nesses termos, pede deferimento.
Cidade Maravilhosa, RJ, para Brasília/DF, data da assinatura digital.
Wendell rodrigues da Silva
OABRJ 231921
Colendo Tribunal Superior do Trabalho
Processo 000000
Recorrente: XXXXXXXX XXXX XXXX
Pressupostos Extrínsecos
Demonstração de preenchimento dos pressupostos extrínsecos do recurso
O recurso é tempestivo, está regular a representação processual e preparo dispensado. Estão preenchidos, portanto, os pressupostos recursais extrínsecos.
RAZÕES DE EMBARGOS
Pressupostos específicos
DOENÇA PSIQUIÁTRICA. SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR. TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. AUSÊNCIA DE PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO EMPREGADO CONTRATADO MEDIANTE CONCURSO PÚBLICO. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. DISPENSA. CONTRARIEDADE À SÚMULAS 126 E 443 DO TST
Razões para o conhecimento e provimento dos embargos á SBDI-1
Verifica-se que Colenda Xª Turma deste TST conheceu do recurso de revista da reclamada, por violação do art. 5°, II, da Constituição Federal, e, no mérito, deu-lhe provimento para reformar o acórdão regional e restabelecer a sentença que havia julgado totalmente improcedente a reclamatória trabalhista, considerando ter a determinação de reintegração se dado sem base normativa, jurídica ou fática.
Esses são os fundamentos do acórdão recorrido:
(...) 2. REINTEGRAÇÃO
O Regional, no que interessa, deu provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamante, para “determinar a reintegração do reclamante, independentemente do trânsito em julgado desta decisão, além de condenar a ré ao pagamento de salários e demais benefícios contratuais, desde o indevido desligamento”, in verbis:
“4 – Reintegração
O autor busca a reforma da sentença, pois entende que deveria ser reintegrado. Aduz que o despedimento está eivado de nulidades, na medida em que houve ausência de motivação, mesmo sendo, o trabalhador, servidor público celetista. Demais disso, sustenta que ocorreu dispensa discriminatória, posto ter sido desligado logo após o afastamento em razão de doença estigmatizante e, no mesmo diapasão, argumenta que a demissão foi imposta à revelia de garantia de estabilidade normativa.
A sentença assim decidiu o reclamo:
O autor relata ter ingressado na ré por meio de concurso público em 08/05/2017 para o exercício do cargo de „técnico de processo administrativo Jr.‟, sendo imotivadamente dispensado em 09/08/2017.
Diz que ao ser aprovado no concurso público e ter ingressado na ré como servidor celetista em plenas condições de exercer as suas funções, não poderia ter sido dispensado de forma imotivada, ainda mais em razão de a ré fazer parte da administração indireta.
Alega também que na verdade foi dispensado por ser portador de doença grave psíquica (transtorno afetivo bipolar), que em 04/07/2017 obteve atestado médico de afastamento de 30 dias, que no dia 24/07/2017 ingressou com requerimento de benefício por „incapacidade‟ junto ao INSS, sendo agendado exame médico pericial para 20/10/2017; que em 09/08/2017, mesmo afastado em razão de oscilação do quadro de seu transtorno, foi desligado do quadro de funcionários por rescisão antecipada do contrato de experiência sem a devida motivação.
Também diz que sua dispensa é nula porque gozava de garantia de emprego normativa a partir do retorno do afastamento médico, bem como requer o reconhecimento da dispensa discriminatória por ter sido dispensado por ser portador de transtorno bipolar.
A ré impugna o pedido, diz que o autor foi dispensado porque durante o contrato de experiência não correspondeu às necessidades da empresa, que por ser empregado público celetista a sua dispensa não dependeria de motivação, já que não é servidor público estatutário, mas sim celetista.
Alega também que à época da admissão o autor nada relatou sobre seu estado de saúde e sobre seus transtornos psíquicos, por isso não haveria que se falar em dispensa discriminatória.
Por fim, diz que a estabilidade prevista na cláusula 39ª do acordo coletivo da categoria é aplicável somente aos empregados com contrato por prazo indeterminado.
Em seu depoimento pessoal o autor diz que não informou para o médico do trabalho que era portador de transtorno bipolar desde 2006, que no período de experiência foi orientado por diversas pessoas, dentre elas Sr. X e que às vezes quando o Sr. X explicava, o depoente se levantava para pegar as impressões que ficava em outro sala, que não disse ao Sr. X que „não queria aprender mais nada‟ e não sabe que foi avaliado.
A testemunha arrolada pela ré, Sr. X, diz que trabalha na reclamada desde 2008 na função de técnico de sistema de transporte, que chegou a ministrar treinamento para o reclamante, que este não tinha muito aproveitamento porque ele saía da sala, que não sabe dizer o motivo de ele sair da sala, mas não era para pegar documentos na impressora, que questionou o reclamante porque o fato dele sair da sala fazia com que a explicação tivesse que iniciar novamente e este para o depoente de forma ríspida e agressiva que ele saía para assoar o nariz porque estava resfriado, que o reclamante disse que não iria mais aprender com o depoente e foi até o encarregado se queixar, que não sabe dizer como era o relacionamento do reclamante com as demais pessoas da equipe, que provavelmente o encarregado fez avaliação do reclamante nesse período, que o reclamante não tinha posto fixo e treinava com diversos colegas e não sabe que o reclamante tem uma doença.
Pois bem. O art. 37 da Constituição Federal, „caput‟ prevê que mesmo a administração indireta deve observar os princípios da legalidade e da moralidade.
Considerando que o empregado público submete-se a concurso público caso queira ingressar na Administração Pública, tendo, portanto, uma forma de ingresso diferenciada do empregado da iniciativa privada, entendo pela necessidade de motivação para a dispensa de tal empregado.
Tratando-se de Administração Pública a motivação dos atos, mesmo discricionários, é regra já que apenas dessa forma poderá ser verificada sua legalidade e moralidade, conforme exigência constitucional imposta à administração indireta (art. 37, caput da CF).
Não se pode admitir que o empregado público seja admitido por concurso público e dispensado sem motivação alguma, pois desta maneira seria muito fácil burlar a lista de classificação do certame e toda a moralidade que é exigida na contratação dos empregados públicos.
Nesse sentido, Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, 32ª ed., Malheiros Editores, pág.439-440): „O ato de dispensa, no nosso entender, deve ser motivado, expondo-se por escrito o seu motivo ou a sua causa. A motivação decorre dos princípios da legalidade, da eficiência, da moralidade e da razoabilidade, pois só com ela é que poderão ser afastados os desligamentos de celetistas motivados por perseguição política ou por outro desvio de finalidade. Se o particular pode, em tese, desligar o empregado que queira, o mesmo raciocínio não cabe tratando-se de empregado público.
De fato, em razão dos princípios citados e como acentuado em outro tópico, a relação de administração é distinta da relação de propriedade. Nesta, a propriedade e a vontade prevalecem; naquela, o dever ao influxo de uma finalidade cogente. Assim, sem motivação que demonstre finalidade pública a dispensa é ilegal.‟.
Para colocar fim a tal discussão, o Plenário do Supremo Tribunal Federal por meio do Recurso extraordinário nº 589998, publicado em 21/03/2013, cuja matéria constitucional teve repercussão geral reconhecida, decidiu que é obrigatória a motivação para a dispensa de empregados de empresas estatais e sociedades de economia mista, tanto da União quanto dos estados, municípios e do Distrito Federal.
No presente caso, verifica-se que, ao contrário do alegado pelo reclamante, a prova testemunhal e documental comprovam que houve devida motivação na dispensa do autor. Senão vejamos.
A avaliação de desempenho juntada pela ré (ID 6ece7b0 - fl. 363 do PDF) indica que o reclamante, que havia sido admitido recentemente pela ré (em 08/05/2017), obteve notas muito baixas quanto ao período de 23/05/2017 a 21/07/2017, principalmente nos itens ‘conhecimento do trabalho’ e ‘relacionamento pessoal’, fato corroborado pela prova testemunhal, que mencionou que o autor não obteve muito aproveitamento nos treinamentos e agia de forma ríspida e agressiva com o treinador.
Assim, verifica-se que o reclamante não fora dispensado arbitrariamente pela ré, mas sim pela sua atuação como empregado no período de experiência.
Assim, não há que se falar em reintegração ao emprego por tal motivo.
Também não procede a alegação do autor quanto à suposta dispensa discriminatória, já que ele mesmo, segundo o depoimento pessoal, disse nunca ter informado ao médico do trabalho ser portador de transtorno bipolar.
Pelo mesmo motivo, não faz jus o autor ao pagamento de indenização por danos morais.
Indefiro o pedido „10.6‟.
Quanto à estabilidade normativa, a cláusula 39ª do ACT 2015/2017 dispõe o seguinte: „CLÁUSULA 39 - GARANTIA AO EMPREGADO AFASTADO PELO INSS Ao EMPREGADO em gozo de benefício previdenciário será garantido o emprego ou salário desde o 16º (décimo sexto) dia de afastamento até o 150º (centésimo quinquagésimo) dia após a alta, exceto para os EMPREGADOS que praticarem falta grave, bem como, não se aplicando aos ocupantes de cargos de confiança - ditos de livre provimento e exoneração - contratados sem concurso público.‟
Conforme atestado médico juntado pelo sob ID b76ceb9 (fl. 104 do PDF) e espelhos de ponto juntados sob ID 4efd697 (fl. 358 do PDF), o reclamante afastou-se do trabalho no período de 04/07/2017 a 02/08/2017 (total de 30 dias).
No entanto, é incontroverso que as partes celebraram contrato de experiência de 90 dias (ID fc97af5 - - fls. 95/96 do PDF), iniciado em 08/05/2017 e que a dispensa ocorreu em 09/08/2017. Ou seja, a sua duração foram os exatos 90 dias previstos no contrato.
Tratando-se de contrato a termo e com a duração máxima de 90 dias (art. 445, §único da CLT), a estabilidade prevista na referida cláusula normativa não lhe é aplicável, já que incompatível com tal modalidade contratual que possui data certa para término. Referida norma apenas compatibiliza-se com os contratos por prazo indeterminado.
Assim, pelos motivos expostos, indefiro os pedidos „10.1‟, „10.4‟ e „10.5‟.
Como se percebe, reclamante lançou não uma, mas algumas razões para que a reintegração pudesse ser deferida. E a sentença enfrentou todas, concluindo pela ausência do direito à pretensão postulada.
Porque o apelo repete essas mesmas razões, com alguns acréscimos, passo à análise das motivações indicadas pelo recorrente, sem demora.
4.1 - A cláusula normativa e o contrato de experiência
O recorrente adverte, neste ponto, que a origem contou erroneamente os dias do contrato de experiência e, por conta disso, quando do desligamento, o lapso de 90 dias já estava transposto (o reclamante teria permanecido 93 dias na reclamada, não 90).
Em contrarrazões (fl. 434) a reclamada alega que o contrato do autor durou de 08/05/2017 a 08/08/2017 e que o reclamante ficou afastado por 30 dias desde 04/07/2017. Segundo, ainda, as contrarrazões, o autor teve o término de contrato de experiência antecipado, vez que a reclamada considerou que o trabalho efetivo foi de apenas 53 dias, na medida em que o período de afastamento deveria ser entendido, nos termos do artigo 467 da CLT, como lapso de afastamento.
E, ao menos em relação à contagem, creio que a ré tem razão. Os documentos de fls. 111 e 112 (este último o TRCT) comprovam que reclamante foi desligado, efetivamente, por antecipação do término do contrato de experiência. Em outras palavras: a ré não considerou o lapso de afastamento como efetivo contrato (procedimento que me parece adequado e, inclusive, mais protetivo ao trabalhador), não se podendo alegar - como fez o reclamante - que o prazo do contrato de experiência foi ultrapassado.
Isso, entrementes, não resolve inteiramente a questão. Se o reclamante estava doente - fato incontroverso -, com afastamento de 30 dias, não houve transposição do lapso de duração do contrato de prova. Todavia, o recorrente também argumenta que, ainda que o contrato de experiência pudesse ser considerado em vigor, sem irregularidades, a cláusula normativa - exposta acima, na transcrição da sentença -- não apresenta essa hipótese contratual como exceção à garantia de emprego. Em outras palavras: a sentença criou uma exceção, não prevista pelos sindicatos que assinaram a norma coletiva, desrespeitando a autonomia privada coletiva.
Essa sim, uma questão que demanda reflexão. E não pouca.
A tradição do direito do trabalho era no sentido de que os contratos por prazo determinado, como o contrato de experiência, não representariam solo fértil para o florescimento das garantias de emprego. Por conta desse entendimento, gestantes que engravidavam no contrato de experiência não adquiriam nenhuma garantia, mesmo existindo a norma constitucional prevendo a necessidade da permanência da grávida no emprego (e mesmo inexistindo, no texto constitucional, qualquer expressa exceção aos contratos por prazo determinado) e o mesmo ocorria com o trabalhador que se acidentava no transcurso de contratos desse jaez, ou nos casos em que os dirigentes sindicais, ou cipeiros, faziam inscrições para as eleições durante tais períodos.
O tempo passou, todavia, e a jurisprudência progrediu para entendimentos diversos. Por conta dessa evolução, v.g., a grávida, hoje, consoante o que está previsto na súmula 244, III1, do TST, tem garantia de emprego, mesmo quando engravida durante o contrato de experiência, coisa semelhante ocorrendo com aqueles que se acidentam no trabalho, conforme súmula 378, III,2 do TST. Os cipeiros e dirigentes sindicais, entrementes, ainda não alcançaram tais proteções3, talvez - penso eu - porque, nesses casos, o ato de vontade do trabalhador seja determinante para o enquadramento na hipótese que faz nascer a garantia, enquanto no acidente e na gravidez (em que pese a possibilidade existir) presume-se que a vontade não foi decisiva no acontecimento.
A súmula 378, III, do TST, porém, não se aplica ao caso dos autos, vez que o problema de saúde do reclamante não tem nexo causal com as atividades laborais desenvolvidas na ré.
Entrementes, seria relevante questionar, efetivamente: mas por que não? O balizador citado tem, como se sabe, relação com a garantia de emprego prevista pelo artigo 118, da Lei 8.213/91, que tem o objetivo específico de conceder ao trabalhador acidentado - ou que desenvolve doença ocupacional - um tempo de readaptação após a alta médica. A ideia é que o obreiro que, por exemplo, sofreu um acidente que causou a perda de uma mão, precisaria do ano previsto no artigo 118 para superar o trauma do acidente e, além disso, conseguir se adaptar às novas condições de trabalho, com a diminuição de capacidade laboral da qual é, pós acidente, portador.
Obviamente, esses casos extremados não se repetem em todas as hipóteses de doença ocupacional, mas a garantia serve para todos, sem distinção.
No caso dos autos, não é o artigo 118 que está em discussão, mas sim a cláusula 39, da norma coletiva entabulada entre as partes, cuja redação é - transcrevo-a, mais uma vez - a seguinte:
„CLÁUSULA 39 - GARANTIA AO EMPREGADO AFASTADO PELO INSS Ao EMPREGADO em gozo de benefício previdenciário será garantido o emprego ou salário desde o 16º (décimo sexto) dia de afastamento até o 150º (centésimo quinquagésimo) dia após a alta, exceto para os EMPREGADOS que praticarem falta grave, bem como, não se aplicando aos ocupantes de cargos de confiança - ditos de livre provimento e exoneração - contratados sem concurso público.‟
Como se percebe pela transcrição supra, a cláusula 39 dá garantia de emprego a todos os trabalhadores que fiquem afastados por mais de 15 dias, qualquer que seja a razão do acidente (de trabalho ou não) ou da doença (ocupacional ou não), situação diversa daquela coberta pelo artigo 118, da Lei 8.213/91.
Como o reclamante se enquadra nessa situação, restaria mesmo concluir se a cláusula se aplica a ele, ou se, como entendeu a origem, o contrato de experiência o excluiria do benefício.
Minha interpretação em relação a tal situação é, data venia, contrária àquela adotada pelo primeiro grau de jurisdição. A norma coletiva não apresenta qualquer exceção relacionada ao contrato de experiência, parecendo certo concluir que, quando as categorias pretenderam excepcionar a regra (como no caso da justa causa e cargos de confiança), fizeram-no expressamente. A tradição pertinente ao contrato determinado, como exceção „natural‟ às hipóteses de garantia de emprego, como visto nos exemplos alinhavados acima, não tem resistido ao transcorrer dos tempos.
Dia após dia vemos surgirem exceções a essa regra, chegando-se ao ponto de não se ter segurança - seria oportuno refletir - em considerar se ela ainda mereceria ser entendida como válida, no nosso contexto social.
No caso dos autos, precisamente, a doença do trabalhador parece ter precipitado - e prejudicado - a decisão do empregador sobre o contrato de prova e sem razão justificável para tanto (veremos, a seguir, a pontuação do reclamante, na avaliação a que foi submetido pela ré). Em lugar disso, melhor seria que a empregadora tivesse obedecido à garantia de emprego, prolongando a prova pelos dias faltantes, inclusive, e realizando uma avaliação completa e sem açodamento do obreiro, não se cometendo nenhum absurdo interpretativo ao se erigir a hipótese de que também para isso serviria a garantia de emprego prevista na cláusula 39 já transcrita, justificando-se, assim, a compatibilidade, na individualização casuística concreta, da norma coletiva com o contrato de experiência.
Destarte, tenho como certo que a cláusula 39 da norma coletiva mantida entre as partes assegurava garantia de emprego ao reclamante e que, por conseguinte, a reclamada violou tal disposição concencional, ao despedi-lo sem respeitar o lapso de 150 dias após a alta médica.
4.2 - Necessidade de motivação no desligamento
Outra situação, existente no caso aqui examinado, precisa ser mencionada, para que a equação completa do problema se concretize.
Refiro-me ao documento de fl. 100, que é um „aditivo de prorrogação de contrato de experiência‟, assinado pelo reclamante e reclamada, onde as partes resolvem prorrogar o contrato de prova, firmado em 08/05/2017 (com término previsto para 06/06/2017) por mais 60 dias. O que se percebe, por tal documento, é que as partes entenderam que a avaliação recíproca realizada nos 30 primeiros dias foi insuficiente, precisando de mais 60 dias para que uma opinião fosse firmada com segurança. Infelizmente, porém, o reclamante adoeceu - fato incontroverso - e ficou afastado por 30 dias, desde 04/07/2017. Portanto, embora as partes tenham concordado que precisavam mais 60 dias para consolidar as avaliações recíprocas (o aditamento foi assinado em 27/05/2017), após 37 dias da assinatura do aditamento o reclamante não mais compareceu ao trabalho. Teriam sido suficientes, esses 57 dias (de 08/05/2017 a 04/07/2017) para que o reclamante fosse avaliado, considerando que após quase trinta dias as partes informaram que mais 60 dias seriam necessários para esse intento? O documento de fl. 363, citado pela sentença, é uma avaliação realizada pela ré, em relação ao período 23/05/ a 21/07/2017, considerando-se, como já foi dito, que o reclamante esteve afastado do trabalho desde 04/07/2017. Seriam, dessa forma, cerca de 40 dias corridos de contrato para a avaliação.
Ao contrário da interpretação dada pela origem, não considero que as notas do autor fossem „muito baixas‟. O documento descreve 10 itens de avaliação, onde a nota máxima total seria de 50 pontos, dos quais o autor conseguiu fazer 29. Quatro pontos acima da média, portanto, ou 58% de aproveitamento. Uma nota 6, numa escala de 1 a 10, que é, por exemplo, o que se exige dos advogados brasileiros para serem aprovados no exame nacional da OAB (prova de segunda fase, porque, na primeira fase, 50% de acerto já redunda em aprovação).
Mas o mais interessante do exame desse documento, como alicerce para a afirmação de que o reclamante não foi aprovado na experiência, é perceber que ele é único, isto é, não há outra referência documental, nos autos, dando conta das razões do desligamento do reclamante. A comunicação de desligamento (fl. 111) não apresenta qualquer motivação ou justificativa para a conduta da ré, informando, apenas, que o contrato estava sendo rescindido „por rescisão antecipada do contrato de experiência‟ por iniciativa da reclamada.
Isso, obviamente, impõe a indagação: poder-se-ia considerar que essa avaliação seria a motivação necessária ao desligamento do trabalhador? Motivar não quererá dizer „informar a razão pela qual‟ faço ou deixo de fazer alguma coisa? Quando a lei impõe que o juiz fundamente (motive) a sentença, poderia o magistrado fazê-lo sem mencionar na sentença a prova que julga ser decisiva para a resolução do conflito? A resposta, quero crer, não pode deixar de ser negativa. Se é preciso motivar a decisão, isso só pode significar que os interessados devem receber uma explicação clara sobre o que levou a parte a adotar determinada conduta.
Nesse diapasão, motivar a decisão pela rescisão contratual deveria significar que o trabalhador deveria ser informado, claramente, a respeito das razões pelas quais o desligamento estava ocorrendo, inclusive com a apresentação da avaliação em que as notas (que a reclamada considerara insuficientes) estivessem consignadas. Só assim, creio, o trabalhador conseguiria compreender, de forma adequada, quais as razões do despedimento e, mais que isso, poderia ter condições de contestar as conclusões do empregador e buscar elementos para contraditá-la, caso julgasse ser esse o caso.
Nada disso aconteceu, no caso dos autos. A reclamada demitiu o reclamante sem informar por qual razão o fazia, como visto, e só se dignou a alegar que a avaliação do trabalhador havia sido a razão do despedimento em contestação, quando trouxe o documento já tantas vezes citado ao processo.
Portanto, minha impressão sobre esse ponto é que, efetivamente, não houve motivação explícita para o ato que redundou no desligamento do reclamante.
Mas vou além. Ainda que se pudesse considerar que a motivação devesse ser avaliada apenas a partir do contexto processual, ou seja, que se considerasse que a motivação pudesse ser apresentada agora e não, necessariamente, quando do desligamento, não creio que as razões da defesa poderiam prevalecer. Como já demonstrei, a avaliação do reclamante não tem nada de claramente negativa. É uma avaliação indicando, repito, que o obreiro está um pouco acima do rendimento médio.
É claro que se poderia argumentar que o empregador tem todo o direito de formar um equipe de trabalhadores excepcionais. Assim como o treinador da seleção brasileira só quer para o time dele os melhores, a reclamada poderia determinar que não trabalhariam para ela os medíocres, mas apenas aqueles com padrão de excelência comprovado. Se a tese é admissível, a realidade, entretanto, não a corrobora. Não há nada nos autos que indique que seria, a reclamada, uma empresa com exigências de contratação acima do comum. Nenhum documento veio aos autos esclarecendo qual seria o padrão que a reclamada considera - como regra - indispensável para este ou aquele item das verificações por ela entabuladas, não podendo, por isso mesmo, o julgador criar hipóteses que fujam de um „padrão comum‟ do mercado de trabalho. E não me parece que a regra do mercado seja, justamente, que apenas os trabalhadores excepcionais podem trabalhar.
Destarte, minha conclusão, após o exame da avaliação apresentada pela ré, é no sentido de que ela, por si só, não revela nenhuma padrão de conduta indicativa de que o reclamante não estivesse na média dos trabalhadores brasileiros e, por isso mesmo, não consigo vislumbrar, no referido documento, nenhum indicativo da incompatibilidade do obreiro com as funções de „técnico de processo administrativo júnior‟ para as quais ele fora contratado (lembro, por oportuno, que o reclamante foi aprovado em concurso, antes de iniciar o período de prova, situação que, ainda uma vez, reforça a conclusão de que se trata de um trabalhador acima do nível médio do mercado).
Acrescento, por oportuno, que a única testemunha ouvida em juízo foi um dos muitos instrutores do reclamante, durante o tempo em que autor esteve trabalhando para a ré. O testigo declarou que
„o depoente chegou a ministrar treinamento para o reclamante; o reclamante não tinha muito aproveitamento porque ele saía da sala; não sabe dizer o motivo dele sair da sala, mas não era para pegar documentos na impressora; o depoente questionou o reclamante porque o fato dele sair da sala fazia com que a explicação tivesse que iniciar novamente; o reclamante respondeu para o depoente de forma ríspida e agressiva que ele saía para assoar o nariz porque estava resfriado; o reclamante disse que não iria mais aprender com o depoente e foi até o encarregado se queixar
O depoimento supra indica, pelo menos para mim, que houve um desentendimento entre reclamante e testemunha, na medida em que o autor estava resfriado e não conseguia acompanhar, sem interrupções, as explicações desta última. Ao que parece, nem a testemunha ficou satisfeita com a situação, nem o reclamante, que preferiu buscar outro instrutor. Nada disso, entretanto, permite concluir que, só por conta desse desentendimento, o reclamante não estivesse apto para trabalhar na ré, ou que fosse avesso à disciplina ou hierarquia. Esse único evento, ainda mais porque lastreado em um acontecimento não corriqueiro (o resfriado do reclamante), não pode ser determinante na conclusão de que o aproveitamento do obreiro era irremediavelmente insuficiente para o trabalho e, mais que isso, que ele apresentava comportamento indisciplinado/insubordinado, inadequado à contratação.
Portanto, minha conclusão acerca desse tópico do conflito é, primeiro, que a reclamada não motivou o desligamento do reclamante de forma adequada. Depois, se se considerasse - e eu assim não considero -- que a motivação poderia ser feita apenas no contexto processual, a avaliação apresentada pela ré em conjunto com a testemunha ouvida por ela não me convencem, em absoluto, de que o reclamante não estivesse em um padrão pouco acima da média de atuação, suficiente -- face à falta de evidencias de um nível de excelência de atuação dos contratados da empresa - para a manutenção do contrato entre as partes.
Vale lembrar que a tese da reclamada foi, inicialmente, que não havia necessidade de motivação do desligamento, posição que, como se sabe, vai contra o entendimento consagrado pela tese prevalente 25 deste Regional:
25 - Empresa pública e sociedade de economia mista.
Dispensa imotivada. Impossibilidade. Necessidade de motivação. (Res. TP n0 02/2017 - DOEletrônico 19/04/2017) Há necessidade de motivação do ato de dispensa de empregado de empresa pública e de sociedade de economia mista.
4.3 - Despedimento discriminatório
A inicial sustentou, ainda, que houve discriminação no desligamento e, com base na Lei 9.029/95 e no entendimento consagrado pela súmula 443 do TST, postulou a reintegração ao trabalho.
O balizador citado pelo libelo tem a seguinte redação:
Súmula nº 443 do TST DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.
A sentença tratou do pedido, nos seguintes termos:
Também não procede a alegação do autor quanto à suposta dispensa discriminatória, já que ele mesmo, segundo o depoimento pessoal, disse nunca ter informado ao médico do trabalho ser portador de transtorno bipolar.
Pelo mesmo motivo, não faz jus o autor ao pagamento de indenização por danos morais.
Indefiro o pedido „10.6‟.
Mais uma vez - e sempre respeitosamente --, não consigo concordar com as conclusões da origem.
Primeiramente, cabe observar que o fato do trabalhador não tem informado ao médico do trabalho que era portador do „transtorno afetivo bipolar‟ não significa, como parece ter entendido a sentença, que a ré desconhecida esse fato.
O trabalhador não está obrigado a revelar, ao médico que o examina na admissão no trabalho, ou ao entrevistador, situações íntimas que não tenham relação com as atividades que vai desempenhar no emprego. A inviolabilidade da intimidade (art. 5º, X, da Constituição Federal) alicerça essa afirmação.
Todavia, no caso dos autos, como bem destacou o recorrente, é indisputável que a reclamada tinha amplo conhecimento da doença do reclamante, vez que o documento de fl. 97 (elaborado pela empresa) aponta que o reclamante estava sob a CID F31 (que é o código do transtorno afetivo bipolar) e, além disso, o próprio preposto declarou, em audiência, que „...só souberam do transtorno bipolar do reclamante quando ele faltou 2 dias injustificadamente e apresentou atestado‟.
Num segundo momento, cabe considerar se a doença do reclamante poderia ser considerada dentre aquelas que despertam o preconceito em nossa sociedade. E a resposta, nesse passo, não pode deixar de ser positiva.
Fio-me, para tanto, na campanha levantada pela Associação Brasileira de Psiquiatria4 contra a psicofobia. Visando elaborar uma estratégia eficiente contra o referido preconceito, a ABP convidou pessoas famosas, como o comediante Chico Anysio, a atriz Cássia Kiss e o locutor Luciano do Vale (este último portador de bipolaridade5), para tratarem do tema de forma pública, esclarecendo as pessoas sobre as particularidades e realidades da doença.
No próprio sítio da Associação6, há informações sobre a campanha (que foi realizada em 2012), onde se lê: O preconceito está entre as principais dificuldades enfrentadas pelas pessoas portadoras de transtorno bipolar.
Conhecida como psicofobia, essa discriminação é o que a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) quer combater com a campanha „A Sociedade Contra o Preconceito‟, lançada no 30º Congresso Brasileiro de Psiquiatria, que termina hoje em Natal, no Rio Grande do Norte. A iniciativa busca informar sobre a doença, que afeta 2,2% da população - cerca de 4 milhões de brasileiros. (Grifei) Portanto, parece razoável concluir que sim, a doença de que o reclamante é portador está dentre aquelas que geram preconceito e causam discriminação, dentre nós.
Fixadas essas premissas, seria, então, o caso de se verificar se, nestes autos, poderíamos concluir que reclamante foi vítima de discriminação.
Poderíamos? Bem, a prova da discriminação está muito longe de ser coisa simples.
Nos dias que correm, é coisa muito difícil - quase impossível - encontrar-se a declaração aberta e desavergonhada da intolerância em relação ao diferente, como aquela que se vê nos filmes de Hollywood, com placas proibindo a entrada de pessoas negras -- antes da década de 60, do século passado -- em determinado ambiente. Isso está muito longe de significar, obviamente, que evoluímos muito e deixamos de discriminar nossos semelhantes.
Basta uma passada de olhos em qualquer relação comparativa de salários entre homens e mulheres, v.g., para se verificar que as discriminações no emprego persistem, só que agora (em regra) em formas dissimuladas e, por vezes, mesmo inconscientes.
Por conta disso mesmo, o direito processual tem buscado mecanismos para tornar a prova menos desequilibrada e mais apta àqueles com maiores dificuldades de acesso aos elementos necessários ao convencimento do julgador. Claro exemplo desse esforço, está na teoria dinâmica da prova, adotada pelo nosso novo Código de Processo Civil, no parágrafo primeiro do artigo 373, e reproduzido, em grande parte, pela nova redação do artigo 818 da CLT.
O caso dos autos, entretanto, não precisa ser resolvido com essas novas ferramentas processuais. A tradicional visão - consagrada na cabeça do artigo 373 do NCPC - do ônus da prova, combinado com o entendimento consagrado pela súmula 443, do TST, é suficiente para o solução do impasse.
Como consta do balizador em questão, presume-se discriminatória a „despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito‟.
Portanto, caberia ao autor (ônus dele, ou, se se preferir, fato constitutivo do direito do trabalhador), em situações relacionadas com a transcrição supra, provar que houve um ato que o prejudicou (o despedimento) e que ele se enquadrava no grupo protegido (ser portador de doença que gere preconceito), sendo certo que, como já explanado anteriormente, essa prova foi realizada. Por conseguinte - e nos termos da súmula 443 -, deve-se presumir o despedimento discriminatório no caso dos autos.
Tal presunção, obviamente, admite prova em contrário e, portanto, caberia à reclamada (prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor) demonstrar que o desligamento ocorreu por qualquer outra razão que não a doença.
Qual foi a razão pela qual a ré despediu o reclamante? Segundo a defesa, em razão de desempenho insuficiente, durante contrato de experiência, para que a aprovação no concurso fosse confirmada pelo período de prova. Ora, como visto nos itens precedentes, essa alegação defensiva não restou corroborada pela prova dos autos. A ré não conseguiu convencer que o desempenho do trabalhador fosse tão ruim que justificasse considerá-lo como inapto para as tarefas a que se havia classificado pelo concurso em que fora aprovado.
Resultado: a reclamada não conseguiu fazer a prova dos fatos extintivos, impeditivos ou modificativos do direito do autor, prevalecendo, diante disso, a presunção de que o despedimento teve motivação discriminatória.
4.4 - Conclusão deste item
A conclusão a que chego, portanto, após percorrer toda a argumentação desenvolvida pelas partes é que A) Reclamante estava protegido por cláusula de norma coletiva que assegurava a ele garantia de emprego de 150 dias após a alta médica, sendo que a reclamada não respeitou tal disposição; B) A reclamada estava obrigada a motivar a decisão relacionada ao desligamento do obreiro e não o fez. A motivação oferecida apenas quando da discussão processual não convenceu, vez que o reclamante apresentou, conforme avaliação da própria reclamada, desempenho superior à media, sem que se demonstrasse, de nenhuma forma, que o padrão de contratação da empresa envolvia exigências, como regra, superiores às habilidades de que o reclamante é portador; C) A presunção do despedimento discriminatório não foi desbastada pela reclamada, considerando-se, assim, que o reclamante faz, efetivamente, jus à reintegração.
5 - Da reintegração (efetivação)
Face ao que se disse no item anterior e considerando-se que o afastamento do trabalho, de forma injustificada, representa o comprometimento do salário, verba alimentar por natureza, acolho o pedido do autor relacionado à reintegração, determinando que esta se realize por oficial de justiça, independentemente do trânsito em julgado desta decisão (art. 300 do NCPC), nas funções contratuais do demandante, observados todos os termos do contrato, com pagamento de salários e demais vantagens da função devidamente corrigidos conforme cláusulas normativas pertinentes, devidos e não pagos, vencidos desde a data da dispensa nula (09/08/2017),e, vincendos, até sua efetiva reintegração, computando-se nos cálculos os vencimentos totais de cada mês, além do recolhimento do FGTS, no importe de 8%, à conta vinculada do Reclamante, décimos terceiros salários e férias proporcionais, acrescidas de 1/3 do salário normal.
Em caso de recusa ou criação de dificuldades e embaraços, por parte da reclamada, para a realização da obrigação de fazer, esta pagará multa diária de R$ 500,00 até que a reintegração se complete.” (fls. 442/455 – seq. n° 3 – grifos apostos e no original)
À referida decisão, a reclamada, pautada em violação dos arts. 818 da CLT, 299, 300, 373 e 1.029, § 5°, do CPC, 114 do CC, 5°, II, 7°, XXVI, e 37 da CF, em contrariedade às Súmulas nos 414, I, e 443 do TST e em divergência jurisprudencial, interpôs recurso de revista, postulando a concessão de efeito suspensivo do recurso que determinou a imediata reintegração do reclamante, ao fundamento que restaram configurados os requisitos correlatos ao fumus boni iuris e ao periculum in mora. Aduz, ainda, que não há falar em reintegração, tendo em vista a interpretação extensiva da cláusula normativa ao contrato de experiência, que houve motivação na dispensa, bem como que sua ausência não garantiria a reintegração, tendo em vista decisão proferida nos autos do Recurso Extraordinário n° 589.998. Alega, além disso, que não poderia ter havido conclusão de dispensa discriminatória com base em doença que não gera estigma, tampouco preconceito (fls. 558/603 - seq. n° 3).
Do que se infere dos autos, o Regional determinou a reintegração do reclamante, com amparo em três fundamentos, quais sejam, disposição coletiva, dispensa imotivada e dispensa discriminatória.
Do que se infere, ainda, da decisão regional, a norma coletiva que arrimou a reintegração determinava que “ao empregado em gozo de benefício previdenciário será garantido o emprego ou salário desde o 16º (décimo sexto) dia de afastamento até o 150º (centésimo quinquagésimo) dia após a alta, exceto para os empregados que praticarem falta grave, bem como, não se aplicando aos ocupantes de cargos de confiança - ditos de livre provimento e exoneração - contratados sem concurso público”.
Ora, não obstante seja incontroverso que o reclamante tenha se afastado do trabalho, também é incontroverso que ele foi dispensado no término do contrato de experiência.
Logo, não pairam dúvidas de que o reclamante não poderia fazer jus à benesse prevista por meio de disposição coletiva, pois estando vigente contrato a termo, tem-se por inconciliável qualquer estabilidade, ou seja, vigorando contrato de experiência por prazo determinado, cuja finalidade é a de verificar se o empregado tem aptidão para exercer a função para a qual foi contratado, por certo que uma cláusula normativa no sentido da estabilidade no emprego é incompatível com aquela modalidade contratual que tem época já definida para seu término.
Por outro lado, verifica-se que a decisão regional concluiu pela configuração de dispensa discriminatória por mera presunção, tendo em vista que o reclamante era portador de transtorno bipolar.
Ora, consoante a jurisprudência pacificada nesta Corte Superior, consubstanciada na Súmula n° 443, “presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego”.
Entretanto, na hipótese dos autos, o reclamante foi dispensado no final do contrato de experiência, porque segundo a reclamada, ele não correspondeu às necessidades da empresa, a rechaçar as alegações de dispensa discriminatória.
Se não bastasse, não obstante a prática discriminatória na dispensa do empregado configurar abuso de direito, nem toda doença grave suscita estigma ou preconceito, não sendo notório que os portadores de transtorno bipolar sejam vítimas de intolerância.
Com efeito, não se pode ter como certo que o transtorno bipolar suscite estigma ou preconceito, mormente por se tratar de doença não contagiosa e que não permite considerações de ordem moral ou religiosa.
Assim, embora se presuma discriminatória a despedida de empregado portador de doença grave que suscite estigma ou preconceito, esta não é a hipótese dos autos, pois conforme já mencionado, a doença que acomete o recorrido não suscita estigma, tampouco preconceito, razão pela qual não é presumível a natureza discriminatória da dispensa.
Por fim, quanto à motivação da dispensa, extrai-se do acórdão regional que houve a referida motivação.
Mesmo que assim não fosse, consoante preconizado pelo item I da Orientação Jurisprudencial n° 247 da SDI-1 desta Corte Superior, “a despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade”.
Ademais, nos moldes definidos pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário n° 589998, e na esteira do que definido por ocasião dos embargos declaratórios, Relatados pelo Ministro Ricardo Lewandowski no último dia 10/10/2018, a necessidade de motivação da dispensa somente se aplica à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, e não às demais empresas públicas e sociedades de economia mista, in verbis:
“O Tribunal, por maioria, acolheu parcialmente os embargos de declaração para fixar a seguinte tese: „A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT tem o dever jurídico de motivar, em ato formal, a demissão de seus empregados”, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Edson Fachin, que rejeitavam integralmente o recurso. Juntará voto o Ministro Marco Aurélio. A presente tese substitui aquela fixada na 12ª sessão administrativa realizada em 9.12.2015. Impedida a Ministra Rosa Weber. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 10.10.2018.”
Logo, tendo sido determinada a reintegração do reclamante à míngua de alicerce normativo, jurídico ou fático, conclui-se pela configuração de ofensa ao art. 5°, II, da CF.
(...)
REINTEGRAÇÃO
Como consequência lógica do conhecimento do recurso por violação do art. 5°, II, da CF, dou provimento à revista para reformar o acórdão regional e restabelecer a sentença que havia julgado totalmente improcedente a presente reclamatória trabalhista. Dessarte, reputo prejudicada a análise dos temas remanescentes. Oficie-se, com urgência, o Juízo da XXª Vara do Trabalho de São Paulo-SP, dando-lhe ciência do inteiro teor desta decisão
Em resposta aos embargos de declaração da parte autora, a c. Turma assentou que “constou, expressamente, da decisão ora embargada, os fundamentos fáticos e jurídicos a pautar a conclusão de configuração de ofensa ao art. 5°, II, da CF, com consequente provimento do recurso de revista interposto pela reclamada, mormente diante da ausência de alicerce a amparar a reintegração do reclamante”.
Fez constar expressamente a ausência de contrariedade às Súmulas 126 e 443 do TST, “haja vista que todo o quadro fático havia sido consignado pelo Tribunal a quo, o qual deixou evidente que a Súmula n° 443 não tem a aplicabilidade à hipótese aqui controvertida”.
Os termos do referido acórdão:
In casu, o reclamante utiliza-se do remédio alusivo aos embargos declaratórios, sustentando que se faz necessário o prequestionamento da matéria constitucional e legal que dará alicerce ao recurso de embargos e, eventualmente, ao recurso extraordinário. Aduz, ainda, que não restou configurada violação literal e direta ao art. 5°, II, da CF, mormente porque o acórdão embargado procedeu à interpretação de dispositivos infraconstitucionais, resultando em ofensa aos arts. 8°, § 3°, da CLT, 7°, XXVI, da CF e 104 do CC. Afirma, também, que houve desrespeito a alínea "b" do art. 896 da CLT e contrariedade às Súmulas nos 126 e 443 do TST.
Ora, embora a ausência de prequestionamento obste o conhecimento do recurso para a instância superior, por certo que se refere a questão não decidida, hipótese não configurada nos autos.
Se não bastasse, constou, expressamente, da decisão ora embargada, os fundamentos fáticos e jurídicos a pautar a conclusão de configuração de ofensa ao art. 5°, II, da CF, com consequente provimento do recurso de revista interposto pela reclamada, mormente diante da ausência de alicerce a amparar a reintegração do reclamante.
Nem se diga, além disso, que restou configurada contrariedade às Súmulas nos 126 e 443 do TST, haja vista que todo o quadro fático havia sido consignado pelo Tribunal a quo, o qual deixou evidente que a Súmula n° 443 não tema aplicabilidade à hipótese aqui controvertida.
Dentro deste contexto, a decisão embargada não merece reparos ao concluir
(…)
Logo, não evidenciados os vícios elencados nos arts. 897-A da CLT e 1.022 do CPC, outra conclusão não há que não a de rejeição dos presentes declaratórios.
Rejeito os embargos de declaração.
A Xª Turma consignou ter a corte local determinado a reintegração do reclamante com amparo em três fundamentos, quais sejam, disposição coletiva, dispensa imotivada e dispensa discriminatória.
Quanto à norma coletiva, a c. Turma assentou que o reclamante, dispensado no término do contrato de experiência, “não poderia fazer jus à benesse prevista por meio de disposição coletiva, pois estando vigente contrato a termo, tem-se por inconciliável qualquer estabilidade, ou seja, vigorando contrato de experiência por prazo determinado, cuja finalidade é a de verificar se o empregado tem aptidão para exercer a função para a qual foi contratado, por certo que uma cláusula normativa no sentido da estabilidade no emprego é incompatível com aquela modalidade contratual que tem época já definida para seu término”.
Também fundamentou não se tratar de dispensa discriminatória, a despeito de o autor ser portador de transtorno bipolar, em razão de o reclamante ter sido dispensado no fim do contrato de experiência por não ter correspondido às necessidades da empresa, segundo a reclamada.
Asseverou que, “embora se presuma discriminatória a despedida de empregado portador de doença grave que suscite estigma ou preconceito, esta não é a hipótese dos autos, pois conforme já mencionado, a doença que acomete o recorrido não suscita estigma, tampouco preconceito, razão pela qual não é presumível a natureza discriminatória da dispensa”.
Assentou que, mesmo não houvesse a motivação, aplicar-se-ia o item I da Orientação Jurisprudencial n° 247 da SDI-1 desta Corte Superior, a qual preconiza que “a despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade”.
Com isso, acresceu que o STF, nos autos do RE 589.998, firmou tese de que a necessidade de motivação da dispensa somente se aplica à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, e não às demais empresas públicas e sociedades de economia mista.
Sem embargo do registro da c. Turma sobre ser incontroverso que o reclamante se afastou do trabalho e foi dispensado no término do contrato de experiência, consta do acórdão regional a existência de “um aditivo de prorrogação de contrato de experiência‟, assinado pelo reclamante e reclamada, onde as partes resolvem prorrogar o contrato de prova, firmado em 08/05/2017 (com término previsto para 06/06/2017) por mais 60 dias. O que se percebe, por tal documento, é que as partes entenderam que a avaliação recíproca realizada nos 30 primeiros dias foi insuficiente, precisando de mais 60 dias para que uma opinião fosse firmada com segurança. Infelizmente, porém, o reclamante adoeceu - fato incontroverso - e ficou afastado por 30 dias, desde 04/07/2017”.
A Colenda Turma equivoca-se, data venia, na aplicação do direito haja vista que o conhecimento do recurso de revista por violação do artigo 5º, II, da Constituição não é direta como exige o art. 896, “c”, da CLT, porque a violação do preceito constitucional foi verificada após a análise da Súmula 443 e de norma legal (artigo 4º da Lei 9.029/95), tendo a c. Turma procedido à interpretação de dispositivos infraconstitucionais que, supostamente, causariam lesão reflexa ao referido artigo constitucional. Em se tratando de interpretação de norma coletiva, o recurso deve se fundamentar no art. 896, “b”, da CLT.
O Transtorno Afetivo Bipolar, doença que acomete o recorrente, é patologia que suscita estigma, e a c. Turma, ao entender que não se trata de dispensa discriminatória, ao fundamento nuclear de que não se trata de doença estigmatizante nem contagiosa, violou a Súmula 443 do TST.
Ora, ainda, que por se tratar de matéria fático-probatória, a decisão da Turma afrontou a Súmula 126 do TST, pois se o Tribunal Regional do Trabalho da xª Região concluiu que a doença psíquica acarretou estigma no ambiente de trabalho, essa não é matéria que poderia ser reavaliada em sede de recurso de revista.
O ora recorrente não desconhece a jurisprudência firmada no âmbito dessa SBDI-1, no sentido de que, em regra, não é possível o conhecimento do Recurso de Embargos por contrariedade a súmula ou orientação jurisprudencial de natureza processual, como é o caso da Súmula nº 126 do TST.
No entanto, o conhecimento dos Embargos por contrariedade à Súmula nº 126 tem sido admitido, ainda que de forma excepcional, nas situações específicas em que, para chegar a uma conclusão diversa daquela registrada no acórdão regional, a Turma acaba por realizar novo exame ou nova valoração das provas dos autos, seja invocando um fato não consignado pela Corte local, seja partindo de realidade fática diversa daquela por ela esposada.
Na hipótese, verifica-se que a xª Turma incorreu em contrariedade à Súmula nº 126 do TST, uma vez que: a) partiu de realidade fática não registrada no v. acórdão regional; e b) apresentou conclusão fática diversa daquela expressamente consignada pelo e. TRT.
Ainda, sobre a motivação da dispensa, que segundo a c. Turma do TST “o reclamante foi dispensado no final do contrato de experiência, porque segundo a reclamada, ele não correspondeu às necessidades da empresa, a rechaçar as alegações de dispensa discriminatória”, consta do acórdão regional a conclusão de que “ao contrário da interpretação dada pela origem, não considero que as notas do autor fossem ‘muito baixas‟. O documento descreve 10 itens de avaliação, onde a nota máxima total seria de 50 pontos, dos quais o autor conseguiu fazer 29. Quatro pontos acima da média, portanto, ou 58% de aproveitamento. (...). A comunicação de desligamento (fl. 111) não apresenta qualquer motivação ou justificativa para a conduta da ré, informando, apenas, que o contrato estava sendo rescindido „por rescisão antecipada do contrato de experiência‟ por iniciativa da reclamada”.
O Colegiado local acrescentou que “a avaliação do reclamante não tem nada de claramente negativa. É uma avaliação indicando, repito, que o obreiro está um pouco acima do rendimento médio. (...). Não há nada nos autos que indique que seria, a reclamada, uma empresa com exigências de contratação acima do comum. Nenhum documento veio aos autos esclarecendo qual seria o padrão que a reclamada considera - como regra - indispensável para este ou aquele item das verificações por ela entabuladas, não podendo, por isso mesmo, o julgador criar hipóteses que fujam de um „padrão comum‟ do mercado de trabalho. (...), não consigo vislumbrar, no referido documento, nenhum indicativo da incompatibilidade do obreiro com as funções de „técnico de processo administrativo júnior‟ para as quais ele fora contratado (lembro, por oportuno, que o reclamante foi aprovado em concurso, antes de iniciar o período de prova, situação que, ainda uma vez, reforça a conclusão de que se trata de um trabalhador acima do nível médio do mercado. (...)Depois, se se considerasse - e eu assim não considero -- que a motivação poderia ser feita apenas no contexto processual, a avaliação apresentada pela ré em conjunto com a testemunha ouvida por ela não me convencem, em absoluto, de que o reclamante não estivesse em um padrão pouco acima da média de atuação, suficiente -- face à falta de evidencias de um nível de excelência de atuação dos contratados da empresa - para a manutenção do contrato entre as partes”.
A Súmula nº 443 do TST dispõe que "presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego".
Assim, uma vez caracterizada a natureza estigmatizante da doença acometida ao autor e sendo esta grave, há a presunção relativa de que sua dispensa importou em discriminação, o que pode ser elidido por prova em contrário, a cargo da reclamada.
Nesse sentido os seguintes precedentes desta Corte, que tratam do ônus da prova, envolvendo, inclusive, contrato de experiência:
SDI-1 TST 2023 EMBARGOS REGIDOS PELA LEI Nº 13.015/2014, PELO CPC/2015 E PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 39/2016 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. DANO MORAL. REINTEGRAÇÃO. DISPENSA DISCRIMINTÓRIA. EMPREGADA PORTADORA DE LÚPUS . INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 443 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. 1. Discute-se, in casu, se a doença lúpus é capaz de provocar estigma e preconceito suficiente para ensejar o reconhecimento de presunção de dispensa discriminatória da empregada acometida por essa enfermidade, à luz do disposto na Súmula nº 443 do Tribunal Superior do Trabalho, segundo a qual "presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego". 2. Segundo a literatura médico-científica, o lúpus é uma "doença inflamatória autoimune, que pode afetar múltiplos órgãos e tecidos, como pele, articulações, rins e cérebro. Em casos mais graves, se não tratada adequadamente, pode matar", que faz com que as células de defesa do indivíduo por ela acometido ataquem, por engano, suas própriascélulas sadias, provocando, frequentemente, diversas reações, como dores constantes, febre, sensibilidade demasiada à luz, queda de cabelo e manchas pelo corpo, podendo, ainda, ocorrer perda auditiva e alterações neuro-psiquiátricas, como convulsões, psicoses e depressão, dentre outras manifestações clínicas. Estudos apontam que "os que convivem com pessoas com LES (Lúpus Eritematoso Sistêmico) (companheiro, filhos e outros familiares) deparam com reações emocionais, oscilações clínicas e interferências no papel social, no trabalho e no desempenho de atividades diárias". 3. Portanto, não há dúvidas de que a doença da autora é grave, incurável e demanda tratamentos multidisciplinares e contínuos, bem como que, no momento em que mais precisava de recursos materiais para custeá-los, foi dispensada sem justa causa pela reclamada. 4. Incontroverso, por outro lado, que, em razão da doença, a reclamante se ausentava com frequência do trabalho, tendo sido admitido pelo preposto da reclamada que "a obreira foi demitida em razão das ' muitas faltas' ao trabalho". 5. Nesse contexto, tem-se que, além de a doença da autora ser grave o suficiente para provocar estigmas ou gerar preconceitos, não é razoável supor que a dispensa da reclamante não tenha decorrido de discriminação, diante das constantes ausências, ainda que justificáveis, relatadas pela própria reclamada, de forma que, diante de todo o contexto fático-probatório dos autos, presume-se discriminatória a dispensa da reclamante. 6. Ademais, do teor da Súmula nº 443 desta Corte, extrai-se que, em casos de doenças graves, deve ser invertido para o empregador o ônus de comprovar que a dispensa do empregado, portador de doença grave, não se deu por motivo discriminatório, mas sim por algum motivo plausível, razoável e socialmente justificável, de modo que afastasse o caráter discriminatório da rescisão contratual. Assim, mesmo que se admita como relativa a presunção de que a dispensa da empregada portadora de doença grave seja discriminatória, não consta na decisão regional que a empregadora, que tinha conhecimento da doença grave da autora, tenha se desincumbido de seu ônus de provar que a dispensa ocorreu por algum motivo distinto e razoável, razão pela qual a decisão embargada não se coaduna com a exegese da Súmula nº 443 do Tribunal Superior do Trabalho. Embargos conhecidos e providos. (Processo: E-ED-RR - 1206-70.2016.5.12.0053 Data de Julgamento: 29/06/2023, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 04/08/2023).
SDI-1 TST 2014 AGRAVO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA DE PRESIDENTE DE TURMA QUE NEGA SEGUIMENTO A RECURSO DE EMBARGOS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. EMPREGADA PORTADORA DE DOENÇA CRÔNICA GRAVE (LÚPUS). SÚMULA 443 DO TST. Discute-se se a dispensa da reclamante, portadora da doença lúpus, constituiu ato discriminatório por parte do empregador, à luz da diretriz jurisprudencial recomendada na Súmula 443 do TST, que uniformizou a jurisprudência sobre a dispensa arbitrária de trabalhador portador de doença grave que suscite estigma ou preconceito, para entender que se presume discriminatória a dispensa, com fundamento nos princípios insculpidos na Constituição Federal de 1988 notadamente os arts. 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, caput e XLI, e 7º, I, XXX, 170, III. A lúpus é uma doença crônica, incurável, com fases de surto, em que o tratamento do paciente requer o afastamento da atividade laboral, e por ser inevitável essa ausência periódica para idas ao médico, realizações de procedimentos quimioterápicos e até mesmo internações hospitalares, muitas vezes o empregado portador dessa doença sofre atos de preconceito diante dessas ausências justificáveis. Daí a razão de entender-se que o poder diretivo do empregador, inerente à atividade empresarial, não é absoluto, há limites ao seu exercício, fixados sobretudo em razão dos princípios fundamentais de proteção à dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho - postulados constitucionais estabelecidos como fundamentos do Estado Democrático Brasileiro no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, bem como em nível internacional pela Convenção 111 da OIT, e em âmbito federal pelo art. 1º, da Lei 9.029/95. Quanto à questão da presunção discriminatória a que alude a Súmula 443 do TST, in casu, não há dúvida de que, por ocasião da dispensa da reclamante, o empregador já tinha conhecimento da moléstia. Ainda que no depoimento da testemunha do reclamado tenha constado que a -reclamante foi dispensada em razão de uma restruturação do banco-, entende-se que tal não é suficiente para afastar a presunção de que trata a Súmula 443 do TST, por não ser possível extrair do acórdão regional transcrito no acórdão turmário que essa -reestruturação do banco- ocorreu de forma ampla, alcançado outros empregados além da reclamante, e que a atividade por ela exercida não tenha sido contemplada na nova estrutura de serviço bancário prestado pelo agravante. Agravo desprovido." (Ag-E-ED-RR - 4408-09.2010.5.02.0000, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 12/9/2014, grifou-se).
SDI-1 TST 2023 EMPREGADO DIAGNOSTICADO COM ESCLEROSE MÚLTIPLA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. SÚMULA Nº 443 DO TST. A controvérsia cinge-se a definir se a dispensa do autor, diagnosticado com esclerose múltipla, teve caráter discriminatório. A jurisprudência desta Corte entende ser presumidamente discriminatória a dispensa, sem justa causa, de trabalhador com doença grave ou estigmatizante , invertendo-se, assim, o ônus da prova, de forma a atribuir à empresa a comprovação de que a dispensa não ocorrera de forma discriminatória. O entendimento consagrado no referido verbete sumular tem a finalidade de conferir eficácia ao princípio fundamental da continuidade da relação de emprego (artigo 7º, inciso I, da Constituição Federal) e proteger os trabalhadores que se encontrem em situações de vulnerabilidade, impondo ao empregador uma obrigação negativa, qual seja a comprovação robusta de que a dispensa não possui contorno discriminatório, alegando, para tanto, motivos técnicos, econômicos ou financeiros, buscando, assim, evitar a dispensa do empregado com dificuldades de reinserção no mercado de trabalho e concretizar o comando constitucional da busca do pleno emprego. Desse modo, na hipótese dos autos, constata-se que foi imputado, equivocadamente, ao autor o ônus da prova da conduta discriminatória por parte do empregador e, por ausência de prova nesse sentido, decidiu-se contra ele. Nesse contexto, a decisão da Turma, ao considerar discriminatória a dispensa do autor, está em consonância com a Súmula nº 443 desta Corte, razão pela qual não merece reforma. Agravo desprovido. (Processo: Ag-ED-E-ED-RR - 11176-71.2014.5.01.0053 Data de Julgamento: 29/06/2023, Redator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 01/09/2023).
SDI-1 TST 2023 I - AGRAVO EM EMBARGOS EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. RECLAMANTE. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE E ESTIGMATIZANTE (NEOPLASIA MALIGNA). DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. Ante a provável má aplicação da Súmula nº 443 do TST, aconselhável o provimento do agravo para determinar o processamento dos Embargos. Agravo a que se dá provimento. II - EMBARGOS EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. RECLAMANTE. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE E ESTIGMATIZANTE (NEOPLASIA MALIGNA). DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. 1 - A presunção de que a dispensa de empregado portador de doença grave ou estigmatizante é discriminatória foi uniformizada por meio da Súmula nº 443 do TST: "Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego". 2 - A SDI-1, no julgamento do processo E-ED-RR-68-29.2014.5.09.0245, ocorrido em 04/04/2019, de relatoria do Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, concluiu que a neoplasia maligna (câncer) é doença grave que causa estigma, de modo a possibilitar a aplicação da presunção da dispensa discriminatória prevista na Súmula nº 443 do TST. 3 - Em matéria de discriminação na relação de emprego, importa notar que o Brasil ratificou a Convenção n. 111 da OIT, comprometendo-se a formular e aplicar uma política nacional com a finalidade de promover "igualdade de oportunidades em matéria de emprego e profissão, com o objetivo de eliminar toda discriminação nessa matéria". Referida norma internacional conceitua em seu Art. 1º, II, o que considera discriminação em matéria de emprego e ocupação: "qualquer [...] distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão que poderá ser especificada pelo Membro interessado". 4 - O ato discriminatório praticado pelo empregador fere a dignidade da pessoa humana, vai de encontro a um dos objetivos da República Federativa do Brasil, de erradicar qualquer tipo de preconceito e discriminação (arts. 1º, III, e 3º, IV, da Constituição Federal, respectivamente) e, ainda, deixa de observar o princípio da isonomia (art. 5º, caput, da Constituição Federal). 5 - No âmbito da legislação nacional, houve a positivação da Lei nº 9.029/95, com a finalidade de coibir práticas discriminatórias na relação de trabalho, inclusive relacionadas à manutenção do emprego, conforme se observa do seu art. 1º: "É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas noinciso XXXIII do art. 7oda Constituição Federal". 6 - Deste modo, a Súmula nº 443 do TST, ao prever que, nas hipóteses de doença estigmatizante , será do empregador o ônus de comprovar que a dispensa do trabalhador não é discriminatória, visa coibir a discriminação e proteger a relação de emprego contra despedida arbitrária (art. 7º, I, da Constituição Federal), estando em sintonia com os preceitos internacionais e com o compromisso internacional firmado pelo Brasil ao ratificar a Convenção nº 111 da OIT. 7 - Ademais, a Súmula nº 443 do TST também privilegia o princípio da continuidade da relação de emprego, além da distribuição do ônus da prova a partir do princípio da aptidão da prova, consagrado no art. 373, §2º, do CPC e no art. 818, §1º, da CLT. 8 - Assim, sendo incontroverso que o reclamante é portador de neoplasia maligna - doença reconhecida como estigmatizante pela SBDI-I - cabe à parte reclamada comprovar que a dispensa fundamentou-se em outro motivo, que não guarde relação direta ou indireta com a enfermidade que acomete o trabalhador. Julgados. 9 - No caso dos autos, o acórdão turmário concluiu que os seguintes fatos comprovariam a ausência de caráter discriminatório da dispensa: (i) "o reclamante ficou afastado do trabalho por 'bastante tempo', tendo o reclamado contratado outro profissional para ficar em lugar"; (ii) a dispensa ocorreu "após o fim da licença médica do reclamante"; e (iii) "ciente da moléstia, o reclamado permitiu que o reclamante frequentasse o local de trabalho, almoçasse no centro de treinamento, e, espontaneamente, manteve o pagamento dos salários não exigíveis no período do afastamento". 10 - Contudo, quanto à permissão para frequentar o local de trabalho e manutenção do pagamento de salários não exigíveis no período do afastamento, isso, por si só, não afasta o caráter discriminatório da dispensa porque tais fatos sequer guardam relação com a ruptura do pacto laboral. 11 - A prova que a Súmula nº 443 do TST demanda do empregador diz respeito à ausência de cunho discriminatório do ato de dispensar o empregado portador de doença estigmatizante , eventual ausência de tratamento discriminatório no curso do contrato não comprova a real motivação da dispensa e não elide seu caráter discriminatório. 12 - Quanto ao fato de que a dispensa ocorreu "após o fim da licença médica do reclamante", este tampouco exclui o caráter discriminatório da dispensa, pelo contrário, corrobora com a tese do trabalhador. A dispensa de um empregado, logo após o término de benefício previdenciário, é indício de que o empregador rompeu com o pacto laboral justamente pela necessidade do afastamento para tratamento de saúde, uma vez que dispensou o empregado no momento em que cessou a suspensão contratual decorrente do benefício previdenciário. 13 - E, por fim, quanto ao argumento de que "o reclamante ficou afastado do trabalho por 'bastante tempo', tendo o reclamado contratado outro profissional para ficar em lugar", esses fatos guardam relação direta com a enfermidade do reclamante. 14 - A substituição do empregado adoecido, especialmente quando o único motivo para a contratação do substituto é a licença médica do primeiro, não afasta o caráter discriminatório, ao revés, indica que não havia intenção, por parte da reclamada, em permitir que o trabalhador adoecido retornasse ao seu posto de trabalho. 15 - A contratação de novo trabalhador, em razão da licença médica do empregado adoecido, guarda relação direta com a enfermidade do reclamante e, portanto, não comprova que sua dispensa se deu por motivo alheio à neoplasia maligna. 16 - Diante de todo exposto, conclui-se que os fatos comprovados nos autos não demonstram que a ruptura do pacto laboral decorreu de motivo alheio à enfermidade do reclamante, de modo que a Turma, ao afastar o caráter discriminatório da dispensa do reclamante, incorreu em má-aplicação da Súmula nº 443 do TST. 16 - Embargos conhecidos e providos. (Processo: E-ED-RR - 1001897-90.2016.5.02.0006 Data de Julgamento: 22/06/2023, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 25/08/2023).
SbDI-2 TST 2023 RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO LIMINAR. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. ART. 1.º DA LEI N.º 9.029/1995. DOENÇA RENAL. DIVERSOS AFASTAMENTOS NO CURSO DO CONTRATO DE TRABALHO E INDICAÇÃO DE CIRURGIA DE EMERGÊNCIA. 1. Cuida-se de Mandado de Segurança impetrado contra decisão que deferiu pedido de concessão de tutela provisória de urgência, em caráter antecipatório, que visava a reintegração liminar no emprego, bem como o restabelecimento do plano de saúde, com amparo no fato de ter sido a dispensa discriminatória diante do quadro de doença renal e da iminência de cirurgia. 2. No caso em exame, a análise dos elementos de prova apresentados, em juízo de cognição sumária, revela o atendimento das exigências contidas no art. 300 do CPC de 2015. 3. De fato, tem-se que a litisconsorte passiva foi demitida em 15/5/2022, havendo prova nos autos de diversos afastamentos de poucos dias cada entre os anos de 2019 e 2022. No ano de 2019 consta um afastamento de 5 dias; em 2020 constam 3 afastamentos de 2 dias cada; e, entre 2021 e 2022, foram 49 afastamentos de poucos dias cada. O último afastamento ocorreu no período de 3/5/2022 a 4/5/2022. Há referência nos autos ao prontuário médico da então empregada, que demonstra que a empresa tinha ciência da doença renal e que menciona afastamento de 5 dias para internação em UTI em 2021. A prova dos autos evidencia que a litisconsorte passiva sofre de nefrolitíase esquerda e ITU de repetição, a saber, pedra nos rins e infecção urinária de repetição, tendo sido indicado tratamento cirúrgico de emergência em 17/5/2022, ou seja, apenas dois dias após a demissão. 4. Assim, por mais que a doença renal não seja considerada estigmatizante ou que gere preconceito nos termos da Súmula n.º 443 desta Corte, o fato é que o contexto em que se desenvolveu o contrato de trabalho, com os inúmeros afastamentos e a internação em UTI, sugere que a culminância da demissão logo após o retorno de um afastamento médico e a iminência de uma cirurgia indica uma possível discriminação com a situação da empregada, que a toda evidência ainda se encontrava doente no momento da despedida. Logo, patente a relação de causa e efeito entre a doença renal e a demissão, resta configurada a dispensa discriminatória nos termos do art. 1.º da Lei n.º 9.029/1995 . 5. Não se verifica, portanto, ato ilegal ou abusivo da autoridade coatora que, pelos elementos dos autos, constatou a probabilidade da dispensa discriminatória, a impor a obrigação de reintegrar a litisconsorte passiva imediatamente no emprego. 6. Recurso Ordinário conhecido e não provido" (ROT-381-43.2022.5.17.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 29/09/2023).
Diante das premissas registradas no acórdão regional, a decisão embargada encontra-se em desconformidade com a jurisprudência desta Corte no sentido de que a presunção contida na Súmula nº 443 do TST é aplicável aos casos de empregados acometidos com transtorno afetivo bipolar, transtorno psiquiátrico que acomete o empregado, presumindo-se discriminatória a dispensa, a qual deve ser afastada pela empresa mediante prova, o que não ocorreu na hipótese.
SDI-1 TST 2013 AGRAVO REGIMENTAL. INADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS. DECISÃO DE PRESIDENTE DE TURMA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. TRANSPORNO BIPOLAR. DISPENSA ARBITRÁRIA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. CONTRARIEDADE À SÚMULA 443 DO C. TST NÃO DEMONSTRADA. DESPROVIMENTO. Deve ser confirmada a decisão que denegou seguimento aos embargos, quando o embargante limita-se a indicar contrariedade à Súmula 443 do c. TST, em face de decisão da c. Turma que mantém o julgado regional que, por sua vez, reconheceu como discriminatória a dispensa de empregado, portador de transtorno bipolar, após seu retorno de licença médica. Agravo desprovido. (AgR-E-ED-RR - 875000-13.2005.5.09.0651 , Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 09/05/2013, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 17/05/2013)
TST 2024 I - AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. 1. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. CONFIGURAÇÃO. SÚMULA 443 DO TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Afasta-se o óbice indicado na decisão monocrática e remete-se o agravo de instrumento para análise do Colegiado. 2. INDENIZAÇÃO POR DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. DANO MORAL "IN RE IPSA". CONFIGURAÇÃO. Afasta-se o óbice indicado na decisão monocrática e remete-se o agravo de instrumento para análise do Colegiado. Agravo conhecido e provido. II - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. CONFIGURAÇÃO. SÚMULA 443 DO TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Ante a aparente violação do art. 1º da Lei 9.029/1995, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista, quanto ao tema. 2. INDENIZAÇÃO POR DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. DANO MORAL "IN RE IPSA". CONFIGURAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Ante a aparente violação do art. 5º, X, da Constituição Federal, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista, quanto ao tema. Agravo de instrumento conhecido e provido. III - RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. 1. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. CONFIGURAÇÃO. SÚMULA 443 DO TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. 1.1. Cinge-se a controvérsia acerca da caracterização de dispensa discriminatória de empregada portadora de transtorno afetivo bipolar, uma vez que não comprovado pela ré que a demissão ocorreu por motivo diverso. 1.2. À luz da Súmula 443 do TST, a jurisprudência desta Corte tem como presumidamente discriminatória a dispensa de empregados acometidos de transtornos psiquiátricos, o que pode ser elidido por prova em sentido contrário. Precedentes. 1.3. No presente caso, conclui-se, a partir das premissas consignadas pelo TRT, que a reclamada não se desincumbiu do ônus de comprovar que a dispensa se deu por motivo diverso à notória sujeição da reclamante a transtorno afetivo bipolar, motivo pelo qual o acórdão regional demanda reforma. Recurso de revista conhecido e provido. 2. INDENIZAÇÃO POR DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. DANO MORAL "IN RE IPSA". CONFIGURAÇÃO. 2.1. O "caput" do art. 4° da Lei 9.029/1995 estipula o direito à reparação pelo dano moral decorrente do rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório. 2.2. Também nesse sentido, a jurisprudência desta Corte caracteriza como "in re ipsa" o dano moral relacionado às situações de dispensa discriminatória. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (RR-Ag-AIRR - 20035-04.2018.5.04.0231 , Relatora Ministra: Morgana de Almeida Richa, Data de Julgamento: 27/11/2024, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 29/11/2024)
TST 2024 AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR. DECISÃO EM CONFORMIDADE COM ENTENDIMENTO PACIFICADO DESTA CORTE SUPERIOR. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 1. Tendo em vista a finalidade precípua desta instância extraordinária na uniformização de teses jurídicas, a existência de entendimento sumulado ou representativo de iterativa e notória jurisprudência, em consonância com a decisão recorrida, configura impeditivo ao processamento do recurso de revista, por imperativo legal. 2. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional destacou ser "incontroverso que no período contratual o reclamante esteve internado na Clínica São José no período de 03 a 29/03/2017, para tratamento de transtornos psiquiátricos CID 31.4 e F19". Acrescentou que, "em 10/04/2017, apresentou atestado médico de incapacidade para o trabalho por tempo indeterminado, registrando que era portador de transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo grave sem sintomas psicóticos". Quanto à dispensa sem justa causa, afirmou que "era do conhecimento da reclamada o fato de que o reclamante, quando dispensado, era acometido de problemas psiquiátricos" e que a preposta da reclamada alegou que a causa da despedida foi o baixo rendimento do reclamante. Assim, o acórdão regional, nos moldes em que proferido, encontra-se em conformidade com iterativa, notória e atual jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que se aplica o teor da Súmula nº 443 do TST aos casos em que o empregado padece de transtornos psiquiátricos à época da dispensa, presumindo-se discriminatória a rescisão contratual. Mantém-se a decisão recorrida. Agravo conhecido e desprovido. (Ag-AIRR - 20774-92.2017.5.04.0010 , Relatora Ministra: Morgana de Almeida Richa, Data de Julgamento: 10/04/2024, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/04/2024)
TST 2024 AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/17 - RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO - DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - TRANSTORNO BIPOLAR AFETIVO - DOENÇA ESTIGMATIZANTE - SÚMULA Nº 443 DO TST - ÔNUS DA PROVA - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. Ante a razoabilidade da tese de violação aos artigos 1º, III e IV, 3º, IV, e 7º, I, 170, VIII, da CF/88, recomendável o processamento do recurso de revista, para exame da matéria em epígrafe, veiculada em suas razões. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/17 - RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO - DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - TRANSTORNO BIPOLAR AFETIVO - DOENÇA ESTIGMATIZANTE - SÚMULA Nº 443 DO TST - ÔNUS DA PROVA - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. 1. De acordo com o quadro fático descrito pelo Eg. TRT da 23ª Região, a Reclamada soube que a Reclamante havia sido diagnosticada com transtorno afetivo bipolar antes da decisão de sua dispensa. Isso porque há registro no acórdão regional de que "é incontroverso que a Obreira foi afastada de suas funções, nos meses de junho e julho de 2021, sendo que neste último houve a consignação no atestado do CID 10 F31, o qual se refere a transtorno bipolar" (fls. 1087). A Corte de origem também consigna que a dispensa ocorreu no início do mês de agosto. Entretanto, afirma que posteriormente, em novembro, foi apresentado novo laudo por médico que não indicou diagnóstico fechado sobre a doença da Reclamante, porém, ressaltou que era "evidente que à época da dispensa (11/08/2021) a Autora já sofresse com sintomas depressivos" (fls. 1088). Mesmo com o reconhecimento desses elementos fático-probatórios, a Corte regional afastou a aplicação do entendimento firmado na Súmula nº 443 do TST, por entender que "embora o transtorno psiquiátrico seja considerado patologia grave, a qual pode limitar as condições físicas, emocionais e psicológicas de qualquer pessoa, não há que se presumir que se trata de uma doença que gera estigma ou preconceito" (fls. 1088 - grifos acrescidos). 2. A diretora médica da Bristol-Myers Squibb e professora do curso de pós-gradução do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, Dra. Anna Maria Niccolai Costa, esclarece a dificuldade em se alcançar o diagnóstico correto para pacientes de transtorno afetivo bipolar (TAB) e os prejuízos decorrentes da demora na definição da doença, também no que se refere ao trabalho do paciente.1 Assim, a oscilação de humor, as dificuldades no trabalho e na vida social, bem como a multiplicidade de possíveis diagnósticos não afastam a condição de adoecimento do paciente, mas reforçam sua vulnerabilidade, principalmente, dentro de uma relação de emprego. A medicina identifica que uma das consequências para a vida profissional do paciente que possui o transtorno bipolar não tratado é o desemprego e, dentre as causas para não aderir ao tratamento (que é muitas vezes eficaz) reside no estigma que a doença apresenta. Em estudo de revisão de literatura, a diretora médica da Bristol-Myers Squibb e professora do curso de pós-gradução do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, Dra. Anna Maria Niccolai Costa, destaca que "apenas 50% os pacientes com TAB se encontram empregados 6 meses após alta de hospitalização psiquiátrica19. Isto sugere que tais transtornos psicóticos podem levar a um prognóstico funcional grave desde o episódio inicial e a primeira hospitalização"2 (grifos acrescidos). 3. Diante da enfermidade, a necessidade de afastamento do trabalho, o recebimento de atestado com CID referente à doença psiquiátrica, a Reclamante sofreu uma mudança na sua identidade, precisando agora reconhecer que é portadora de um transtorno mental. Como consequência dessa mudança identitária, após o diagnóstico médico, há registro de tratamento diferenciado por seus pares e superiores, o que é capaz de levar a trabalhadora a passar por uma situação de abalo em sua autoestima. No caso dos autos, a "estereotipagem negativa" foi relatada no acórdão regional, ao afirmar que "a testemunha Shirlei tenha afirmado que, após os afastamentos da Autora, o relacionamento entre ela e os superiores hierárquicos tenha ficado "diferente"" (fls. 1089 - grifos acrescidos). 4. A partir da compreensão mais ampla de como uma doença é capaz de gerar estigma, preconceito e discriminação, foi editada a Súmula nº 443 por este. C Tribunal Superior do Trabalho. O entendimento jurisprudencial que levou à consolidação da tese de que "Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego" (Súmula nº 443 do TST) esteve amparado em julgados que utilizaram como fundamentos: a vedação à discriminação de forma ampla (por ser objetivo fundamental da República Federativa do Brasil previsto no artigo 3º, inciso IV, da Constituição) e também especificamente na relação de emprego (Convenção nº 111 da OIT); o direito à vida, o direito ao trabalho e direito à dignidade, inscritos nos artigos 1º, incisos III e IV, 3º, inciso IV, 5º, caput e inciso XLI, 170 e 193 da Constituição; a proibição à dispensa arbitrária, nos termos do artigo 7º, inciso I, da Constituição; a imperatividade do princípio da função social da propriedade no exercício do direito potestativo de dispensa sem justa causa. 5. Além dessas premissas do Direito Constitucional e do Direito Internacional que tornam imperativa a aplicação de regra de não discriminação nas relações de trabalho, especificamente nas hipóteses de trabalhador acometido por doença estigmatizante, como é o caso do transtorno afetivo bipolar, também é cabível invocar a previsão da Lei nº 9.029/95, que veda todo tipo de prática discriminatória que limite o acesso a uma relação de trabalho ou a sua manutenção. 6. O sociólogo e diretor da École des Hautes Études em Sciences Sociales, Robert Castel, ao tratar da discriminação empregatícia (ainda que não abordando especificamente a questão da doença estigmatizante), afirma que "a ausência de trabalho pode condenar a uma morte social". 3 Ainda destaca que a discriminação no emprego constitui uma diferença que "é uma negação do direito, e ela é absolutamente injustificável segundo o princípio da igualdade de tratamento dos cidadãos perante a lei, vista como um dos fundamentos da República".4 O entendimento firmado pela Súmula nº 443 do TST busca evitar que esse elemento estigmatizante seja causa suficiente para extinguir o vínculo de emprego e, assim, estabelece uma presunção de discriminação para tornar inválida a despedida desse empregado, no intuito de prolongar a relação de trabalho e manter um vínculo necessário para o reconhecimento desse sujeito como trabalhador. Em última instância, a Súmula nº 443 do TST busca resguardar o sentido de vida para o trabalhador acometido por uma doença estigmatizante, cumprindo o dever constitucional de igualdade a partir da vedação da dispensa discriminatória. No caso específico do transtorno afetivo bipolar, como acima bem destacado, há farta produção científica nas mais diversas áreas (medicina, psicologia, sociologia) reconhecendo e demonstrando o impacto da doença na vida profissional dos pacientes. 7. Com amparo no próprio entendimento da Súmula nº 443 do TST, há jurisprudência expressiva desta C. Corte Superior reconhecendo o TAB como doença estigmatizante, bem como arbitrando indenização por dano moral pela dispensa discriminatória. Assim, é fundamental reconhecer o cabimento de indenização por dano moral pela dispensa discriminatória da Reclamante, portadora de doença psiquiátrica estigmatizante. Recurso de Revista conhecido e provido. 1 COSTA, Anna Maria Niccolai. Transtorno afetivo bipolar: carga da doença e custos relacionados. Revisão da Literatura. In: Revista de Psiquiatria Clinica 35 (3); 104-110, 2008, p. 105. 2 COSTA, Anna Maria Niccolai. Transtorno afetivo bipolar: carga da doença e custos relacionados. Revisão da Literatura. In: Revista de Psiquiatria Clinica 35 (3); 104-110, 2008, p. 106. 3 CASTEL, Robert. A discriminação negativa. Cidadãos ou autóctones? Tradução: Francisco Morás. Petrópolis: Editora Vozes, 2011, p. 48 4 CASTEL, Robert. A discriminação negativa. Cidadãos ou autóctones? Tradução: Francisco Morás. Petrópolis: Editora Vozes, 2011, p. 48 (RR - 239-44.2022.5.23.0009 , Relatora Ministra: Liana Chaib, Data de Julgamento: 21/08/2024, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/08/2024)
TST 2023 ACÓRDÃOS DE RECURSOS ORDINÁRIOS PUBLICADOS NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. DESPACHO DE ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS DE REVISTA PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA IN/TST Nº 40. I - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA RUMO MALHA SUL S.A. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA / ACORDO DE COMPENSAÇÃO / REINTEGRAÇÃO - ÓBICE PROCESSUAL - RECURSO DE REVISTA QUE NÃO DESTACA CORRETAMENTE OS TRECHOS DA DECISÃO RECORRIDA QUE CONSUBSTANCIAM O PREQUESTIONAMENTO DAS CONTROVÉRSIAS - INCIDÊNCIA DO ARTIGO 896, §1º-A, I, DA CLT. A recorrente não discriminou corretamente os trechos do acórdão recorrido que consubstanciam o prequestionamento das matérias controvertidas, apenas transcreveu a quase integralidade das razões decisórias, sem proceder a nenhum destaque dos fundamentos fáticos e/ou das teses jurídicas confrontadas no apelo. O TST já firmou a sua jurisprudência, de que a transcrição do inteiro teor do capítulo da decisão regional somente atenderá a exigência do artigo 896, §1º-A, I, da CLT quando os fundamentos utilizados pelo Colegiado de segundo grau forem extremamente concisos e objetivos, o que não ocorre na hipótese dos autos. Precedentes. Agravo de instrumento conhecido e desprovido. II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE EDEMILSON DE AZEVEDO DUARTE . DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - PRESUNÇÃO - EMPREGADO PORTADOR DE TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR - APLICABILIDADE DA SÚMULA/TST Nº 443 E DA LEI Nº 9.029/1995 - REINTEGRAÇÃO - INDENIZAÇÃO POR DANO EXTRAPATRIMONIAL . O Tribunal Regional declarou a nulidade da dispensa materializada enquanto o reclamante ainda aguardava o deslinde da demanda judicial que objetivava o restabelecimento do auxílio-doença comum (transtorno afetivo bipolar). Depreende-se do acórdão recorrido que o trabalhador obtivera êxito em sua pretensão dirigida à Justiça Comum, tendo sido reconhecida a inaptidão para o trabalho e determinada a restauração do benefício previdenciário, com pagamento retroativo até a data do desligamento. Mesmo diante de tal arcabouço fático, o Colegiado a quo afastou o caráter discriminatório da dispensa, por compreender que o caso concreto não se amoldaria às hipóteses descritas na Súmula/TST nº 443 e na Lei nº 9.029/1995 e por entender que caberia ao trabalhador a demonstração de que a rescisão contratual teria sido motivada pela doença psiquiátrica. A Constituição Federal consagrou a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho como fundamentos da República Federativa do Brasil. De outra parte, o legislador constitucional erigiu a construção de uma sociedade justa e solidária e a promoção do bem de todos, sem preconceito ou discriminação, ao patamar de objetivos primordiais do Estado Brasileiro. O rol de direitos e garantias fundamentais da pessoa irradia-se por todo o texto magno, constituindo o principal pilar sobre o qual se sustenta o arcabouço jurídico nacional, inclusive as normas que disciplinam as relações privadas, como é o caso do direito do trabalho. Observa-se que a própria Constituição descreve que constitui direito do trabalhador a relação empregatícia protegida contra a dispensa arbitrária, o que revela a preocupação da sociedade nacional com a proteção do polo hipossuficiente da dinâmica trabalhista. Assim, não é despropositado concluir que o mais significativo preceito norteador do direto do trabalho seja justamente o princípio da proteção ao trabalhador, consubstanciando-se este na ponta de lança que orienta as bases sobre as quais repousa todo o ordenamento juslaboral. O Tribunal Superior do Trabalho sempre procurou minimizar, no plano jurídico, a evidente disparidade intrínseca ao contrato de trabalho, sendo incontáveis as decisões que procuraram assegurar, através da busca pelo equilíbrio entre a norma e a realidade dos fatos, a equidade no julgamento entre o empregado hipossuficiente e a empresa detentora dos meios de produção. E foi justamente essa reiterada jurisprudência que propiciou a edição de diversos verbetes jurisprudenciais de teor eminentemente protetivo, dentre os quais se destaca a Súmula nº 443: "Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego". Assim, nos termos da jurisprudência desta Corte, o desligamento de trabalhador portador de moléstia infamante, realizado por empregador que não apresenta motivos de natureza técnica, econômica, financeira ou disciplinar que justifiquem o expediente gravoso, indicia comportamento empresarial arbitrário e discriminatório. Em se tratando de presunção hominis , lastreada tanto na observação do que ordinariamente acontece quanto no manejo das regras da experiência comum, o ônus da prova se inverte, recaindo sobre o empregador o burden of proof de que o direito de dispensa é regularmente exercido. E nem se persevere na tese defendida no acórdão recorrido, de que os transtornos psiquiátricos não ensejariam estigma e preconceito, porquanto tal percepção encontra-se absolutamente desconectada da ciência e da realidade social. É o que se extrai de trecho de artigo da lavra dos professores Fábio Lopes Rocha, Cláudia Hara e Jorge Paprocki: "Pessoas com doenças mentais graves lutam contra dois problemas: os sintomas, que interferem na autonomia, independência e qualidade de vida, e o estigma social. O estigma associado à doença mental é dos mais importantes e difíceis obstáculos para a recuperação e reabilitação do indivíduo; afeta negativamente o tratamento; nega oportunidade de trabalho; impede a autonomia e a realização de objetivos de vida. É capaz de prejudicar a qualidade de vida, inclusive da família e da equipe de saúde que lida com as doenças psiquiátricas. A discriminação pode ser tão incapacitante quanto a própria doença". No caso dos autos, é bastante significativo o fato de que o trabalhador fora dispensado, sem justo motivo, quando ainda litigava com o intuito de que sua incapacidade laboral fosse reconhecida e de que o seu benefício previdenciário fosse restituído. Nesse contexto, é extremamente difícil escapar da presunção de que o rompimento unilateral do vínculo empregatício teve por motivação a intenção da empregadora de não contar em seus quadros com trabalhador suscetível de recorrência da enfermidade. É evidente que a rescisão unilateral do contrato de trabalho constitui direito potestativo do empregador. Todavia, tal prerrogativa não deve se sobrepor a todo o acervo constitucional e legal construído, democraticamente, com o intuito de salvaguardar os conceitos de igualdade, de solidariedade, de função social do trabalho, de dignidade da pessoa humana, notadamente diante do contexto histórico atual, no qual a adoção de políticas afirmativas de inclusão de grupos minoritários, inclusive dos portadores de necessidades especiais e de doenças graves e/ou estigmatizantes, floresce na população brasileira. Mais a mais, a iterativa, notória e atual jurisprudência do TST é a de que as condutas discriminatórias descritas no artigo 1º da Lei nº 9.029/1995 constituem elenco meramente exemplificativo, notadamente pelo fato de que a Lei nº 13.146/2015 inseriu a expressão "entre outros" na redação original daquele diploma legislativo. Destarte, não subsiste a tese de que a faculdade prevista no artigo 4º da Lei nº 9.029/1995 não poderia ser franqueada ao demandante na hipótese concreta. Configurada a ilegalidade da conduta empresarial, o prejuízo extrapatrimonial dela decorrente fala por si mesmo ( damnum in re ipsa ), ensejando o reconhecimento do direito do trabalhador à reparação correspondente. Recurso de revista conhecido por violação dos artigos 1º e 4º da Lei nº 9.029/1995 e por contrariedade à Súmula/TST nº 443 e provido. CONCLUSÃO: agravo de instrumento da reclamada RUMO MALHA SUL S.A. conhecido e desprovido e recurso de revista do reclamante EDEMILSON DE AZEVEDO DUARTE conhecido e provido " (ARR-184-88.2014.5.09.0001, 7ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 13/10/2023 - grifos acrescidos).
Dessa forma, demonstrada contrariedade às Súmulas 126 e 443 do TST, na forma do art. 894, II, da CLT.
CONCLUSÃO
Requer a embargante o conhecimento do presente recurso de embargos, por contrariedade às Súmulas 126 e 443 do TST, e, no mérito, seja dado provimento para restabelecer o acórdão regional.
Nesses termos, pede deferimento.
Cidade Maravilhosa, RJ, para Brasília/DF, data da assinatura digital.
Wendell rodrigues da Silva
OABRJ 231921








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